25/09/07

Ser mais nobre


A Susana sugeriu que eu talvez quisesse ajudar os outros, enquanto objectivo de vida. De facto, é uma intenção nobre, que toda a gente, sem excepção, deveria ter. Todos deveríamos sentir esse desejo intrínseco de colaborar no bem estar da humanidade, de querer darmo-nos, e não apenas receber, de querer favorecer também os desconhecidos, e não apenas aqueles que fazem parte do nosso pequeno círculo de familiares e amigos.


De repente, sinto-me culpada por não ter tido esses pensamentos. Por não ter contemplado objectivos altruístas na minha mente. Sinto-me envergonhada por só ter experimentado o voluntariado uma vez, algures no início dos anos 90, e nunca mais ter tido a iniciativa para repetir a experiência. E eu que até gostei de o ter feito!


Que inércia, que preguiça esta, que nos limita a cuidarmos dos nossos filhos e pouco mais... é o egoísmo natural das espécies, presumo. Mas o ser humano sabe mais, pode mais do que isso!

24/09/07

NA MESMA COMO A LESMA

Ontem estive, de passagem, no bairro onde morei desde que nasci até aos 30 anos. Sorri para algumas caras familiares, falei com duas ou três pessoas que já me conhecem há muitos anos e vim-me embora de lá com a mesma sensação que sempre experimento quando isso acontece: sinto-me feliz por não ter mudado.
Parece-me que essas pessoas, que me revêem ao fim de muito tempo, têm na cara um ar de admiração (no puro sentido da surpresa) por constatarem isso mesmo: que eu permaneço igual ao que sempre fui. Isto pode parecer estranho a muita gente, mas a verdade é que eu sinto uma espécie de orgulho quando me apercebo de que, realmente, me mantenho fiel a mim própria. Outras pessoas aderem às modas, aparecem com um visual radicalmente diferente, arranjam uma nova maneira de estar e de falar, surpreendem-nos com opiniões e teorias que antes juraríamos impossíveis nas suas cabeças. Eu continuo na mesma. Apenas um pouco mais velha, talvez mais gordinha, mas continuo com a mesma postura despreocupada, com a mesma maneira de ser, algo juvenil e talvez mesmo inocente.
Mas ontem, pela primeira vez, dei por mim a questionar-me sobre esta minha satisfação por ser assim, sempre igual. E se a minha maneira de ser não for boa e eu devesse mudar? Para quê esta estúpida teimosia em ficar na mesma, este incompreensível orgulho em não evoluir?

21/09/07

Arraso dois em um





- Ó mãe, a tia tem as maminhas tão largas...

- "Largas"?! Ah, descaídas, queres tu dizer! Sabes, é que a tia já teve filhos e deu leitinho há mui...

- Sim, descaídas. Como o teu braço.

- Como o meu braço?!! O quê, aqui? Isto?

- Sim :)

20/09/07

Os míticos 80


Circulam por aí, via e-mail, descrições nostálgicas sobre os anos 80, escritas por uma geração saudosa que se compadece dos jovens de hoje, alheios aos grandes valores da nossa juventude, como a série Verão Azul e os desenhos animados do Tom Sawyer.

Eu tinha 9 anos em 1980, por isso fico cheia de vontade de regressar à adolescência quando leio esses textos. E com vontade de falar da minha própria experiência!

Realmente, aqueles tempos não têm nada que ver com os de agora. Éramos uns inocentes, uns pobres diabos, comparados com esta malta que agora tem uma série de gadgets sofisticadíssimos sem os quais não sobrevive, mas éramos extremamente felizes, de uma forma, suponho, muito mais saudável. Os pequenos prazeres da nossa rotina eram, na maior parte dos casos, gozados ao ar livre, ou, vá lá, num quarto escuro, mas na companhia uns dos outros, e sem estarmos agarrados a um qualquer aparelho emissor de radiações.

Na escola – os edifícios eram barracões prefabricados onde chovia no Inverno, para nosso alívio, sobretudo quando as aulas de Química eram canceladas por isso. Cá fora, havia encostas de terra, por onde nos aventurávamos a descer, para cortar caminho para a sala de EV, e onde escorregávamos na lama, quando chovia. Entre dois barracões, havia estreitas passagens onde os namorados mais afoitos se encostavam aos “melos”. À porta da escola, um velho ou uma velha vendia “línguas da sogra”, uns rolos de bolacha, e “serradura”, aparas de bolachas wafer, que nos entretínhamos a cuspir para cima uns dos outros. Os alunos mais problemáticos, além de não estudarem, só diziam palavrões. Não roubavam o dinheiro dos outros, nem lhes batiam, que eu me lembre.

A caminho da escola, no Carnaval, fugíamos aos ovos, que voavam de todas as esquinas e janelas. E quando lá chegávamos, levávamos com farinha no cabelo e havia sempre quem rebentasse uma bombinha de mau cheiro numa sala, para que não houvesse aula. Será que isso ainda acontece?

Na rua – andávamos o dia todo a vaguear, em casa uns dos outros, sem qualquer receio de que alguém nos fizesse mal. Fumávamos às escondidas dos pais, enquanto nos baldávamos às aulas, e experimentávamos os primeiros beijos e apalpões num quarto escuro, em casa de alguém que nunca era eu, porque a minha mãe estava sempre em casa. No meu prédio, que tinha 13 andares, brincávamos aos elevadores, subindo e descendo ansiosamente, para ver quem chegava primeiro ao mesmo andar. Às vezes, andávamos a tocar às campainhas e a fugir. E quando podíamos, passávamos tardes a fazer telefonemas “a gozar”, em que ligávamos para o talho (“- Tem mão de vaca?” “- sim, sim!” “- Então como é que consegue segurar o telefone?!”) ou para um número qualquer, a troçar das pessoas.

Gastávamos a semanada em guloseimas e cromos, ou outras colecções, e tínhamos tudo o que precisávamos para estarmos satisfeitos, o que era tão pouco, que ninguém invejava ninguém.

À noite, lembro-me de me divertir durante horas com um vizinho de cima e o amigo dele, por quem estava apaixonada, a trocar bilhetinhos dentro de um pequeno balde preso a uma corda, que fazíamos subir e descer pela janela. Talvez eu fosse demasiado inocente, para a minha idade e até para aquela época, mas diverti-me à grande, apenas a ser assim.

Mal eu sabia as saudades que iria ter desses tempos em que passava horas a ouvir canções para conseguir escrever as respectivas letras, a escrever cartas em papel (sim, EM PAPEL!) a amigas que via todos os dias, a lanchar em casa delas, a fazer uma banda desenhada a duas, com a minha melhor amiga da altura, em que as personagens éramos nós e os balões eram preenchidos por ela.

Na altura, nem me ocorria que era uma palermice inútil gravar os meus telediscos e anúncios preferidos (o Thriller, do Michael Jackson, o anúncio da Coca-Cola...) em cassetes Beta, porque nunca mais iria pegar nelas; que estavam contados os dias de glória das cassetes áudio onde eu gravava os êxitos da Cidade; que um dia iria ter vergonha, se as guardasse, de mostrar as minhas recordações desses tempos aos meus filhos.

Mas também nunca pensei que iria sentir isto: uma estranha afinidade com as outras pessoas da minha geração, apenas por saber que elas partilharam dessas vivências que são completamente desconhecidas para os jovens de hoje. Cada vez que alguém diz que não sabe quem é o Peter Gabriel, ou que não faz a menor ideia do que era o programa do Vasco Granja, dá-me vontade de me agarrar à primeira pessoa com a minha idade que aparece e chorar com ela por essa era perdida para sempre.

19/09/07

O porquê dos porquês


Este livro ensinou-me, entre outras coisas, algo muito interessante: que o motivo por que as crianças passam por aquela célebre fase dos “porquês” se prende com a sua vontade de estabelecer comunicação com os adultos.
Imaginem o que seria termos de explicar todas as afirmações que fazemos, termos de justificar até as constatações mais óbvias. A duração das nossas trocas de informação multiplicar-se-ia infinitamente (“- adeus!”; “- porquê?”; “porque me vou embora.”; - porquê?”; “porque preciso de ir trabalhar”; “porquê?”; “porque...”) e é precisamente isso que as crianças pretendem: pôr-nos a falar com elas.
Por isso, da próxima vez que um filho, sobrinho, ou filho de um amigo vos perguntar “porque é que as zebras têm riscas?”, não se enfadem e não respondam simplesmente “porque sim”! Encarem isso como um convite para uma agradável conversa em que terão a esplêndida oportunidade de ter quem vos queira ouvir, por mais disparates que digam!

18/09/07

Mórbido voyeurismo

Há dias, na data previsível, vi um documentário sobre a tragédia de 11 de Setembro em Nova Iorque. Dei por mim a pensar que vantagem veriam os sobreviventes em falar publicamente sobre a experiência. Questionei-me sobre a hipótese de alguns deles o recusarem e os motivos que invocariam. Perguntei-me: será que, quando vemos documentários sobre acontecimentos horríveis como esse, aprendemos alguma coisa que valha a pena? E quando vemos filmes como o Alive, aquele sobre o avião que se despenha nos Andes, será por outra razão para além do prazer mórbido que Freud explicou como a pulsão de thanatos?

Incomoda-me que se tenha feito um filme baseado na tragédia de 11 de Setembro. E que algumas pessoas se riam (como ouvi rirem-se) ao ver, em Alive, a encenação dos passageiros do avião a cair no ar, sentados nas cadeiras a que estavam presos, sabendo que aquilo aconteceu de facto. Aliás, confesso que sinto uma certa vergonha de mim própria por gostar de ver filmes baseados em acontecimentos fatídicos, como furacões, vulcões, naufrágios, etc. E quando isso acontece, penso que gostaria de ter a certeza de que ver essas tragédias encenadas traz algum benefício que não ofenda a memória dos que não sobreviveram às verdadeiras.


17/09/07

Gosto de pessoas que...

É óbvio que gostamos de pessoas que sejam parecidas connosco – nos princípios, nas convicções, nos sonhos, nas opiniões. Naturalmente, também gostamos que sejam diferentes de nós em certos aspectos que nos intrigam, estimulam, comovem, ou ensinam coisas novas. Mas, para além do óbvio, há pequeninos pormenores que tocam cada um de nós de uma forma única e às vezes incompreensível para os outros. É desses pormenores que estou a falar quando digo que gosto de pessoas que:

- contam anedotas que me fazem rir sonoramente e depois constatar que isso não acontecia há algum tempo;

- gostam de andar a pé e até me querem fazer companhia quando levo o cão à rua;

- se põem logo à vontade comigo quando me são apresentadas e me fazem sentir que já as conheço há muito tempo;

- insistem em oferecer-me um lanchinho, quando vou a casa delas durante a tarde;

- se lembram, passado muito tempo, de alguma coisa que eu disse e que até fazia sentido;

- confiam em mim, mesmo quando eu não confiaria...;

- têm uns pés bonitos, para os quais não me faz impressão olhar;

- gostam de animais (embora sem exageros ridículos);

- não fumam.

E vocês? Quais são as pequenas coisas que vos fazem gostar de alguém?

14/09/07

Estranhos estranhos


A minha amiga Vida de Praia, na sua "sacola", confessa que não tem a mínima paciência para aqueles estranhos que metem conversa connosco nas filas de supermercado ou nas paragens de autocarro, e que nos obrigam a dizer qualquer coisa quando preferíamos estar calados e sossegados.

Pois eu – e não é por saber que responder-lhes estimula o cérebro! – sempre achei graça a essas conversas que se geram assim espontânea e inesperadamente, pelo potencial que elas representam e pela forma sempre surpreendente como as pessoas se revelam nessas coisas aparentemente insignificantes que dizem.

É verdade que nunca sou a primeira a encetar uma dessas conversas, mas acho sempre interessante que me dirijam a palavra, nem que seja para depois escrever um post sobre isso. E lembro-me sempre de algo que uma professora de Cultura Portuguesa disse uma vez, que me fez pensar, e que era isto: hoje em dia, se entrarmos num autocarro onde só está um passageiro, não nos sentamos ao lado dele – aliás, ele até estranharia se o fizéssemos. Mas na Idade Média, se houvesse autocarros, aconteceria o contrário: o passageiro ficaria melindrado se nos sentássemos longe dele.

13/09/07

Mente fraca


Depois de ter falado de objectivos, parece quase cómico que agora venha falar do meu corpo e de como desejo que volte a ter a forma que tinha antes da gravidez.

Não posso dizer que era esse tipo de objectivo que tinha em mente quando escrevi aquilo. Mas acabo de regressar da rua e, por ter empurrado o carrinho ao sol, num passeio de um quilómetro, cheguei a casa a transpirar. Ao despir-me, constatei o que constato agora todos os dias, mas hoje pela segunda vez: não tenho quase nada que me sirva.

Admiro – com alguma suspeição – as grávidas que voltam a vestir a roupa de antes na mesma semana em que têm os filhos. As que saem com calças justas da maternidade e não parecem o boneco da Michelin mal disfarçado. As que se gabam de terem ficado ainda mais magras do que eram depois do parto.

“Oh, mas o corpo demora uns seis meses a voltar ao que era, na maior parte dos casos!”, dizem-me o médico e as amigas. “Tens de ter paciência e... fazer alguns sacrifícios” – digo eu.

Talvez prefira o sacrifício de ser assim.

11/09/07

Objectivos


Ter objectivos é importante para nos ocuparmos, para darmos um sentido à nossa vida. Os sonhos são bonitos, mas não acreditamos neles. Os objectivos, ao contrário dos sonhos, são atingíveis.

Olho para mim hoje e constato, com satisfação, que tive a sorte de conseguir cumprir todos os objectivos que tinha estabelecido para mim, quando comecei a pensar nisso, durante a adolescência. E vocês estão a pensar: “ou ela é um caso de sucesso, ou tinha objectivos muito modestos...”
Confesso que se trata sobretudo da segunda explicação, eram modestos, sim. Pelo menos para mim, claro. Para um adolescente subnutrido que vivesse num país subdesenvolvido, talvez fossem apenas sonhos, infelizmente. Por isso, logo à partida, tive muita sorte. Mas, por mais fáceis de atingir que sejam os nossos objectivos de vida, realizá-los dá-nos sempre o alento de nos sentirmos bem, capazes, confiantes e... depois um pouco vazios. Depois de atingir o que desejávamos, a vida começa a parecer-nos monótona, falta-lhe aquela motivação interior para chegar algures, para fazer o que ainda não está feito. Talvez este vazio pudesse ser definitivamente preenchido pela crença nalgum Deus, mas como sabem, e apesar de ter frequentado um colégio de freiras, o meu agnosticismo não me permite ver essa luz.
Resta-me meditar um pouco e definir aquilo que ainda me falta cumprir para que a minha existência continue a fazer sentido.

03/09/07

Uma gota de água


... no oceano da minha preguiça!
Agarrei em mim e na família e fomos até ao Parque das Nações, para que a Mecas e eu pudéssemos andar de bicicleta, nem que fosse apenas durante meia hora.
Há anos que não o fazia e até tive medo de ir contra alguém ou alguma árvore! Mas felizmente não me portei mal e ela achou muita graça ao facto de a mãe pedalar ao lado dela. Depois, quando se cansou, sentámo-nos numa esplanada a almoçar. Deliciei-me com uma bela salada de gambas acompanhada de um batido de abacaxi e fiquei verdadeiramente orgulhosa por ter tido a iniciativa de fazer aquele modesto programinha, que não durou mais de duas horas, mas que me soube muitíssimo bem e será uma ocasião a recordar.

02/09/07

Letargia


É fácil deixar-me ficar em casa. O calor em excesso não me convida a praias nem a passeios: prefiro evitar queimaduras, filas de trânsito, lutas desesperadas por um lugar de estacionamento, canseiras a carregar tarecos para fora e para dentro do carro, a omnipresença dos outros.

A recuperação do parto continua a ser uma boa desculpa para me mexer pouco (ou apenas quando me apetece!), o bebé uma excelente razão para ficar aqui, na penumbra dos estores protectores e na frescura pacífica deste nosso mundinho seguro. E a minha barriga vai-se mantendo em forma (isto é, proeminente), na letargia dos dias passados assim.

(29.08.07)