24/01/08

Gromit



Coitadinho do Gromit. Quando o adoptei, noutra casa, noutra vida, tinha muito mais disponibilidade para ele. Dava cinco passeios por dia, recebia festas e mimos a toda a hora e dormia no quarto comigo. Era o meu companheiro, amigo e confidente.
Hoje, que tenho dois filhos e uma vida muito mais preenchida, passou para quinto plano. Dorme no corredor, vai muito menos vezes à rua e é constantemente escorraçado por nós, pelo simples facto de cheirar mal. Mas, apesar de eu raramente lhe fazer festas e, até, de pouco olhar para ele, a verdade é que o Gromit continua a merecer o meu carinho, nunca deixou de ser o meu fiel admirador, nem sequer me guarda qualquer rancor. Os olhos com que me espreita por detrás da franja têm o mesmo brilho alegre de pura devoção e nunca se cansam de dizer-me: "obrigada por me teres tirado da rua!"

Realmente, os cães são nossos amigos para toda a vida, chegando quase a ser estúpidos, tal é a sua entrega aos caprichos dos donos, tantas vezes maus, brutos e insensíveis.

Esta última vez que ele foi violentamente atacado e mordido por outro cão senti que me estava a ensinar alguma coisa. "Olha, eu estou aqui!", parecia dizer-me. Foi preciso ir com ele para o veterinário e andar a pôr-lhe gotas nos olhos de duas em duas horas para eu cair em mim. Para eu parar e reparar: ele ainda está aqui. Faz parte da família e merece a minha atenção.

Desculpa, Mimi. E agora desculpem-me, que tenho de ir ali fazer umas festas ao meu cão.

Bebé tirano


Ser mãe é definitivamente uma grande aventura.
Na maior parte das situações, sentimos que é uma aventura muito boa, apesar de sermos constantemente postas à prova e, sobretudo, de vivermos permanentemente cansadas.
Mas há uma sensação que me incomoda: sentir uma espécie de "medo" do meu bebé, aperceber-me de que ele comanda a minha rotina, concluir que sou uma escrava da dele.

(Não falo de extremos patéticos, de casos em que os pais fazem tudo o que os filhinhos querem e receiam dizer-lhes não, para que eles não façam uma birra interminável.)

Estou a falar do simples facto de andar com pezinhos de lã pela casa, quando ele adormece, sabendo que, se ele acordar, acabou o tempo para mim. Estou a falar de ter de cantar, dançar e sorrir constantemente enquanto ele come, só para que ele abra a boca. De ter de me conformar quando ele se recusa a dormir e me faz autênticas torturas de sono. De quando adormece profunda e angelicamente nos momentos em que preciso de o tirar da cama para sair de casa. De quando começa a palrar de noite, indiferente às horas e ao meu cansaço.

Mas perdoo-lhe essas malvadezas. Porque é apenas um bebé, uma coisinha inocente e querida. Espremo-o contra mim, cubro-o de beijos e palavras doces. E já não sei o que era viver sem ele.

18/01/08

À LUZ DAS ESTRELAS

Há dias recebi um ficheiro Powerpoint sobre a nossa pequenez no Universo, como fotografias que nos fazem ver bem o minúsculo tamanho da Terra perante estrelas como o sol, ou outras ainda maiores. "Pensa nisto", dizia-me o texto.

Quase todos os dias, nós, que temos e-mail, somos bombardeados por mensagens que apelam aos nossos sentimentos ou à nossa inteligência, que nos lembram disto e daquilo, que nos atafulham a cabeça de informação que, na maior parte dos casos, deixa de ser relevante porque a frequência com que a recebemos, ou o "embrulho" estético em que é apresentada tornam o conteúdo banal ou secundário.
Estou-me a lembrar também, por exemplo, de uma sucessão de imagens de africanos famintos com acessórios de moda caríssimos, cujas legendas consistiam na comparação entre o preço exorbitante desses acessórios e a módica quantia necessária para alimentar ou vacinar aquelas pessoas. Vemos coisas dessas, ficamos sensibilizados com a ousadia do artista que concebeu aquela ideia, com a beleza cruel das imagens, finalmente, com a ideia que veiculam, mas depois voltamos à nossa vida. Nem deixamos de comprar objectos supérfluos, nem fazemos uma transferência para uma conta de ajuda humanitária. Ou fazemos?

A era da Informação (ou desinformação, como também lhe chamam), torna-nos ainda mais hipócritas, penso eu. Mas, perante a nossa incrível insignificância neste momento da história do Universo, parece que isso nem sequer importa.

17/01/08

À descoberta de nós próprios

Às vezes sou prisioneira, como tanta gente, dos meus próprios pensamentos. A minha mente é perita em fazer-me crer que estou consciente dos meus sentimentos, das intenções por trás dos meus actos, dos meus objectivos. Mas, na maior parte do tempo, não estou. Estou a ser vítima de mim própria, sem dar por isso.
Hoje vi alguns vídeos de Byron Katie e percebi que aquelas pessoas que falam com ela me mostram o que se passa comigo. Também eu tenho de ser lembrada, de vez em quando, de que sou responsável por tudo o que faço.
Experimentei seguir o método dela, de inverter alguns pensamentos relacionados com "problemas" que tenho, e fiquei espantada com as descobertas que fiz. Se tiverem curiosidade, vão até lá e experimentem também!

11/01/08

Livro-brinquedo-petisco



Ontem fui a uma livraria e, enquanto conversava com uma amiga, peguei distraidamente num livro cujo título achei curioso.
Depois de o ter folheado por uns breves instantes, decidi comprá-lo. É divertido e adequado para crianças e adolescentes, mas eu achei-o irresistível até para adultos - ou pelo menos para adultos como eu, que gostem tanto de animais como de poesia. E a verdade é que cada adivinha deste livro, tão original, é como uma batata frita: apetece sempre mais uma!

10/01/08

Intenção adiada

Libertar-me de mim.
Escrever, sim, mas sem ser prisioneira das palavras que debito neste meu (in)confidente.
Contar-me, pode ser. Mas sem me ler e reler, como se precisasse de me conhecer.

Olhar mais para fora. Abrir mais vezes a janela quando o faço, para não cair na tentação de observar o meu próprio reflexo no vidro, sob o pretexto de olhar lá para fora.

09/01/08

Sono

Não faz muito sentido que uma pessoa como eu, que tem tanto pavor da morte e tanta vontade de aproveitar a vida, precise tanto de dormir.
Gosto de me deitar relativamente cedo e detesto ter de me levantar antes da hora em que o meu corpo decide que já dormiu o suficiente - o que muito raramente acontece antes das 10. Mais do que isso, odeio ver-me obrigada a acordar a meio da noite.
Por isso, agora que a minha filha tem quase cinco anos e finalmente me deixar dormir tudo (ou quase tudo) o que eu preciso, não sei como me fui meter na aventura de ter outro bebé!
Talvez tivesse a (mais uma vez, INGÉNUA) esperança de que o segundo seria bem tranquilo e dorminhoco, para variar. Mas ele não quis variar.
Tenho sono... tenho muuuuuuito sono!

07/01/08

DAAH...

A minha própria ingenuidade surpreende-me constantemente.

No sábado, estive sozinha em casa, o que me torna especialmente vulnerável ao vício das batatas fritas. Sabia que não tinha nenhum pacote em casa, mas mesmo assim fui à despensa várias vezes, como se, miraculosamente, quando abrisse a porta, elas estivessem ali.

Hoje não sabia (como é costume) o que havia de fazer para o jantar. E, sem a mínima ideia do que iria ser a nossa refeição daí a menos de uma hora, pus a mesa.

05/01/08

Conversas de mulheres

Quando estou com outros casais, detesto ver-me de repente "empurrada" para o grupo das mulheres e excluída da conversa dos homens, que se me afigura sempre como mais interessante, ou pelo menos mais divertida do que a das mulheres.
Não sei se é da nossa faixa etária, se é delas, se sou eu (até posso ser eu, tenho de admitir), mas a verdade é que quando estamos juntas só falamos dos filhos e das tarefas domésticas. Os homens, pelo contrário, mesmo que tenham sido pais há pouco tempo, mesmo que ajudem na lida da casa, raramente (ou nunca) desperdiçam o tempo em que estão juntos para contar uns aos outros como planeiam lavar os tapetes da sala, quanto pagam à empregada, ou quais as últimas travessuras queridas dos seus rebentos.
Dou por mim a dizer que sim com a cabeça sem estar a ouvir o que elas dizem, enquanto olho para eles e tento perceber de que é que os homens estão a falar. Quando tenho uma oportunidade, salto para o lado deles e tento entrar na conversa. Mas depois é inevitável sentir-me uma intrusa, uma metediça. E tenho quase a certeza de que eles ficam de orelha murcha, porque o facto de estar ali uma mulher os impede de falar como gostam dos assuntos de que gostam.
O facto de falarmos tanto das nossas facetas de mães e donas de casa pode estar relacionado com o evidente condicionalismo que nos aprisiona a todas: é que, de facto, vemo-nos a braços com uma série de responsabilidades que nos ocupam quase todo o tempo e partilhá-las é uma forma de nos sentirmos apoiadas e de trocar saberes. Mas, caramba! Também lemos, assistimos a programas de entretenimento e cultura, temos opiniões sobre política, sobre a sociedade, temos ideias e sonhos que vão para além da vidinha doméstica, não? Então porque não falamos sobre isso?

BLÁ-BLÁ-BLÁ

Falo sempre de mais nas lojas, com as empregadas (ou donas, é-me igual). Um impulso absurdo de me abrir com desconhecidos leva-me quase sempre a dizer o que não devo, porque não interessa a ninguém e nem sequer vem a propósito, ou vem apenas levemente a propósito, como eu costumo dizer.
Quero ser simpática, mostrar que até sou humilde, por detrás desta aparência um tanto fria e altiva que eu sei que tenho. Levo o Vi comigo e elas metem-se com ele. É o suficiente para eu começar a desbobinar inconfidências. E porquê? É a minha incontrolável necessidade de me dar a conhecer, a minha irritante tendência para falar por falar, a minha despropositada necessidade de agradar, ou tudo junto. E para quê? Para nada. Elas nem sequer ligam ao que eu digo! Confirmo que Montaigne tinha razão, há tantos séculos: ninguém nos ouviria se não estivesse à espera de oportunidade para falar a seguir.

03/01/08

Quase lá

Revisão de provas do livro que publicarei em breve, com uma colega: um desafio interessante, a conversa com o revisor. Acho que não nos saímos mal.

Mas eu fico sempre com a sensação de ser uma diletante, uma pessoa leviana em quase tudo, que se imiscui em actividades para as quais não tem a devida preparação. Ainda assim, penso que ensinar é das coisas que faço melhor. Não por competência científica, mas por vocação pedagógica. Estarei enganada?

01/01/08

Ano Novo

Dia escuro e triste. Uma chuva que paira sobre tudo, ameaçando cair em jorros, mas que apenas pinga levemente, pinta de tons melancólicos a rua, o rio, o céu.

Hesito em telefonar aos meus avós, para lhes desejar um bom ano novo. O que dizer-lhes? Que 2008 lhes traga mais saúde, quando é óbvio que isso não vai acontecer? Que 2008 lhes traga muitas alegrias, quando cada dia para eles é uma dolorosa prova de esforço, em que vagueiam a custo pela casa, raramente saem e poucas visitas recebem?

Vontade absurda de lhes desejar que, ao menos, 2008 não seja o ano da sua morte.